27 junho 2011

Para aqueles que ganharam meu coração

 


Por conta do trabalho, eu passei muitas horas em aeroportos nos últimos meses. Muito mais do que eu gostaria, na verdade. Então, para não pensar no que eu poderia estar fazendo enquanto ficava ali – sem fazer nada –, eu me distraia observando as pessoas chegando e saindo nas salas de espera. Parece entediante, eu sei. Mas eu me divertia imaginando uma história diferente para cada uma delas. Cheguei até a escrever algumas. E foi assim, inventando histórias para desconhecidos, que eu conheci o Álvaro. Ele trabalha há quase 20 anos como motorista de uma empresa em São Paulo e, todos os dias, está em Guarulhos segurando uma plaquinha com o nome de alguém que ele nunca viu na vida. Um sujeito incrível, o Álvaro!

Nos falamos uma única vez. Enquanto nós dois esperávamos, dividimos uma mesa, um café e algumas histórias. E ele me disse uma coisa que eu achei o máximo – todo dia ele se arruma e fica na expectativa de conhecer alguém diferente. Há dias bons e dias ruins. Mas todos os dias existe alguém novo esperando encontrá-lo no aeroporto. “Essa pessoa pode fazer parte da minha vida só alguns minutos, enquanto está no meu carro. Ou pode ficar no meu coração o resto da vida... a gente nunca sabe, né? Então eu me preparo todo dia! Porque a qualquer momento eu posso conhecer alguém que pode ganhar meu coração”. Eu não sei se eu ganhei o coração do Álvaro. Mas ele certamente ganhou o meu. 

Se você botar reparo, vai perceber que só nos falta a plaquinha com o nome... Porque todos os dias conhecemos alguém novo, alguém que pode ganhar o nosso coração para sempre. E na maior parte do tempo, a gente não encara isso com a mesma alegria e expectativa do Álvaro. E aí eu resolvi contar esta história hoje (prestes a ficar longe de um bocado de gente eu amo), porque só agora me dei conta da quantidade de pessoas que ganhou meu coração nos últimos 12 anos. Gente que todo dia ocupa um pedacinho da minha vida e que vai fazer uma falta danada...


Tem uma música do Milton Nascimento que diz: e assim, chegar e partir são só dois lados da mesma viagem. Para não ficar matutando sobre o que estou deixando prá trás, fiz um trato comigo: ao invés de pensar na tristeza da partida, vou fazer como o Álvaro e viver a expectativa da chegada. Mesmo sem "plaquinha na mão", comecei a me preparar para conhecer aqueles que a qualquer momento podem ganhar meu coração em outro lugar. Mas vou já morrendo de saudades. Sabendo que o que "conta mesmo" é saber que tem alguém ali na sala de espera com os braços abertos, cheios de saudade esperando por você. E isso ganha o coração da gente por inteiro...


12 junho 2011

Poeminha Amoroso

No início do ano, durante uma viagem, carreguei comigo um livro da Cora Coralina. Um dos poemas dela, um tal "Poeminha Amoroso", ficou guardado durante meses dentro da minha agenda esperando a hora de sair. Não saiu. Mas como Vinícius e Toquinho disseram certa vez que "mesmo o amor que não compensa é melhor que a solidão" cá estamos, Cora e eu, fechando o bendito Dia dos Namorados com o poeminha que quase ficou esquecido. 

Nunca fui boa com declarações de amor. Gaguejo, fico sem graça e (veja você!), perco as palavras. Ainda bem que sempre há um poeta prá traduzir o que a gente sente. E neste caso, devo dizer, a simplicidade e doçura da caipira Cora Coralina, fizeram toda a diferença... 

Assim, "talvez tu possas entender".


"Este é um poema de amor
tão meigo, tão terno, tão teu... 
É uma oferenda aos teus momentos 
de luta e de brisa e de céu... 
E eu,  quero te servir a poesia
numa concha azul do mar  
ou numa cesta de flores do campo.  
Talvez tu possas entender o meu amor.  
Mas se isso não acontecer,  
não importa.  
Já está declarado e estampado  
nas linhas e entrelinhas  
deste pequeno poema,  
o verso;  
o tão famoso e inesperado verso 
que  te deixará pasmo, surpreso, perplexo...  
eu te amo, perdoa-me, eu te amo..."

Na foto, os avós do fotógrafo americano Scott Schuman. A foto foi feita na França no início da década de 50, meses antes deles se casarem e ficarem juntos por mais de 40 anos

09 junho 2011

Redemoinho

"O redemoinho é para desacomodar as coisas, arranjando o desarranjado, e desarranjando o arranjado". José Oswaldo Guimarães*

Vai ver é isso: um redemoinho passou por aqui e eu nem vi. Porque pelo que eu lembro os redemoinhos são assim mesmo: rápidos e ligeiros.

Ainda criança, a gente vivia correndo atrás daqueles redemoinhos que se formavam no meio do terreiro da fazenda. Os peões diziam que era saci fazendo festa. Mas prá gente nem interessava o que era. A criançada queria era alcançar e entrar bem no meio do tal redemoinho que rodava, rodava e de repente sumia, tão rápido quanto tinha aparecido.

Agora, depois de grande, tenho a impressão que eu finalmente consegui entrar dentro do bendito redemoinho. E moço... que bagunça esse danado faz! Outro dia mesmo passou um por aqui levantando poeira e as folhas que já estavam assentadas. Fez sujeira, bagunçou o que já era certo e sumiu. Não deu tempo nem de ver pra que lado!

Depois daquela ventania toda eu juntei as folhas novamente, tirei daqui, coloquei dali. Sei não... mas parece que continua tudo fora do lugar. Mas pelo rumo do vento, acho vem outro redemoinho por ai. Então agora é esperar. Quem sabe no próximo "o desarranjado volte a se arranjar?" =)


*José Oswaldo Guimarães é Presidente da Associação Nacional dos Criadores de Saci

02 junho 2011

Ruminando

Tem um punhado de músicas que eu só fui entender depois de grande. Era engraçado porque por um bom tempo eu criava as minhas próprias versões. De vez em quando eu inventava umas duas (ou dez) palavras novas para substituir as originais que eu não entendia. Aí sim... na “minha versão” eu entendia tudo, era uma beleza! Na maior parte do tempo eu sabia que estava cantando errado. E mesmo depois que alguém me corrigia, se na “minha versão” a música tivesse ficado mais bonita (prá mim, claro!), eu acabava optando por ela. Ainda faço isso até hoje. Só não conto (nem canto) prá ninguém. =)

Foi assim que eu arrumei uma “ração estragada” para a música do Boldrin...


Ri sozinha lembrando isso hoje. Voltando de uma apresentação do Ricardo Vignini e do Zé Helder, coloquei o som baixinho e “Vide, vida marvada” foi a primeira música que tocou. Engraçado porque a palavra mais difícil na música era justamente a que eu melhor entendia: “ruminando”.


Para o caboclo, isso é coisa de bicho. "Ruminar" é tornar a mastigar, remoer os alimentos que voltam do estômago para a boca. Nojento, né? Eu também achava quando era criança. Mas espia só prá isso: depois de grande descobri que não era só boi e vaca que ruminavam. "Gente" também perde um bocado de tempo remoendo, remascando, remastigando e matutando as ideias. A coisa vai e volta... e a gente nem sempre consegue engolir o assunto e pronto.

Hoje mesmo, enquanto eu ouvia o Boldrin, eu ruminei um par de horas sobre uma história que podia até virar uma moda de viola, de tão comprida. Tem um pedaço desta moda que precisa de uma versão nova, igual as que eu fazia quando era criança. Mas moço... não sai de jeito nenhum! 

Na música do Boldrin, “diz que ruminando dá pra ser feliz”. Então tá, vou ali ruminar mais um bocadinho e depois eu conto procês como é que ficou essa moda...