26 fevereiro 2009

Cheiro de história nova


Por muito tempo o Luiz foi melhor amigo. Destes que a gente conhece quando ainda é criança e que crescem do nosso lado, nos conhecendo melhor que a gente mesmo. Foi com o Luiz que eu aprendi que alguns dias têm cheiro diferente.

O tal “cheiro” era um cheiro que só ele sentia. De vez em quando, sem que nada de especial tivesse acontecido, ele olhava pra mim e dizia: “tô sentindo cheiro de história nova”. Aí eu ria, ia para o meu canto e escrevia. Nestes dias eu escrevia direto, sem apagar nada. Só parava quando me sentia mais leve, quando a história inteira tinha saído de mim.

Enquanto isso o Luiz ficava fazendo cálculos, contas e progressões aritméticas. Uma vez me disse que nós dois gostávamos de vírgulas – eu nas palavras, ele nos números. Mas isso já faz muito tempo, quando eu ainda nem imaginava que ia viver disso: histórias, palavras e vírgulas.

Nunca tinha sentido esse tal “cheiro de história nova” até que hoje me lembrei do Luiz enquanto lia o e-mail do João Molento (outro grande amigo que sempre passa por aqui) me cobrando histórias novas. Pela primeira vez senti o tal cheiro que acompanhou minhas histórias de menina. Aí aproveitei para mudar um pouco a cara do blog e colocar coisas novas aqui. E aposto que o Luiz está dizendo agora com o sorriso no canto da boca: “tô sentindo cheiro de história nova”.

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Falando em cheiro, deu vontade de ouvir “Cheiro de Relva”, um clássico da música sertaneja. Foi escrita há 27 anos pelo compositor Dino Franco, o primeiro a dar voz à música com o parceiro Mouraí, que também sabiam: há dias com cheiro diferente. Um cheiro que só algumas pessoas sentem...

Como é bonito estender-se no verão
As cortinas do sertão na varanda das manhãs
Deixar entrar pedaços de madrugada
E sobre a colcha azulada, dorme calma a lua irmã

Cheiro de relva trás do campo a brisa mansa
Que nos faz sentir criança a embalar milhões de ninhos
A relva esconde as florzinhas orvalhadas
Quanse sempre abandonadas
Nas encostas dos caminhos
A juriti madrugadeira da floresta
Com seu canto abre a festa
Revoando toda a selva
O rio manso caudaloso se agita
Parecendo achar bonita
A terra cheia de relva

O sol vermelho se esquenta e aparece
O vergel todo agradece pelos ninhos que abrigou
Botões de ouro se desprendem dos seus galhos
São as gotas de orvalho de uma noite que passou