31 agosto 2011

Vai doer. Mas é rapidinho!

Aí um dia, tentando fazer uma armadilha para um tatu no fundo do paiol, enfiei um estrepe enorme embaixo da unha. O filho do peão que estava montando a arapuca comigo me olhou com uma cara de “você não vai chorar por causa disso né?”. E aí eu não chorei.

Mas o danado do estrepe latejava. E ficou ali, incomodando um bom tempo. Eu não tinha coragem de mostrar para minha mãe por que ficava pensando na dor para tirar a farpa de madeira. Não importa o quanto algo nos machuca. Às vezes, mesmo com dor, se livrar do que está machucando dói mais ainda...

Dois dias depois, num segundo que eu descuidei da mão, minha mãe viu que meu dedo estava parecendo uma mangaba. Tentei explicar que eu estava esperando o estrepe sair sozinho, mas não teve jeito. Em menos de 10 minutos ela já estava sentada, segurando minha mão de um lado e uma agulha do outro. Aí eu chorei. Muito. Moço... como doeu! E eu ainda estava chorando quando ela disse: “pronto, já tirei. Se tivesse tirado antes, não tinha doído tanto!”.

Tem gente que faz coleção de estrepes embaixo da unha. Um mais dolorido que o outro. E vai deixando ali, esperando prá ver se o bendito sai sozinho. Eu mesma, até hoje, finjo que não estou com vontade de chorar. E ainda escondo um ou outro estrepe embaixo da unha na esperança que ele pare de doer sozinho. Acredite: não pára. E pode apostar, vai doer para tirar. E eu estou sendo honesta porque minha mãe nunca mentia prá gente – quando ia doer ela avisava. Mas também lembrava: “vai doer agora, mas é rapidinho! Depois passa e você pode ir brincar”. Tá, nem sempre é rapidinho. Mas a dor passa mesmo, juro! Eu acho... =)
  

Ainda em tempo: não pegamos o tatu.



29 agosto 2011

Presta atenção

O Gonçalo partiu fora do combinado há alguns meses. E até agora eu não tinha falado disso porque não sabia o que falar. Perder um amigo é algo que “dói a ponto de não dar para respirar”. Aí há alguns dias eu conheci a Dona Jussara, mãe do Gonçalo. E foi ela que encontrou palavras para o que eu achava que não tinha explicação:

 “Às vezes dói a ponto de não dar para respirar. Mas é assim que a gente sobrevive. Você começa de novo todo dia. E de novo. E outra vez no dia seguinte. E sempre, todas às vezes, o mesmo sentimento te deixa sem ar. É uma porteira que reparte o coração entre a saudade e a vontade de continuar vivendo”.

Conversar com a Dona Jussara abriu algumas porteiras no meu coração... Da mesma forma que há quatro anos, no meio de outro redemoinho, o filho dela abriu uma porteira enorme e deixou passar tanto carinho e tanta paciência, que hoje eu faria de tudo para ter só um bocadinho dele aqui perto da gente. E aí eu passei as duas últimas semanas matutando o último pedacinho da minha conversa com a Dona Jussara:

"a vida não é curta do jeito que o povo fala, viu menina? A vida é longa... mas ela é rápida. E passa! Presta atenção porque daqui a pouco não dá mais prá voltar e fazer de novo."

Bom seria aprender isso de um jeito mais fácil. Mas como o Gonçalo mesmo vivia perguntando: "por que é que você insiste em fazer tudo do jeito mais difícil?". Vai saber... “Mas é assim que a gente sobrevive. Você começa de novo todo dia.”

......

"A porteira é a fronteira que meu coração reparte
(...) Vou rezar só pra que o vento nunca vire tempestade
(...) Não vou lutar contra o que me faz feliz
Eu sou assim mesmo... Meu coração está do lado de lá da porteira"







25 agosto 2011

Saudade


A saudade é uma estrada longa
Que começa e não tem mais fim
Suas léguas dão volta ao mundo
Mas não voltam por onde vim
A saudade é um estrada longa
Que começa e não tem mais fim
Cada dia tem mais distâncias
Afastando você de mim
Tantas foram as vezes
Que nos enganamos
Outras vezes nos desencontramos
Sem nem perceber
Mesmo sem razão eu quero lhe dizer
Sem intenção
Ver tudo se perder
Dói tanto, tanto
A saudade é uma estrada longa
Nem é boa e nem é ruim
Vou seguindo sempre adiante
Nunca volto,
Eu sou mesmo assim
A saudade é uma estrada longa
Que hoje passa dentro de mim
Me armei só de esperanças
Mas usei balas de festim

16 agosto 2011

Não faça contas


Durante o mês de julho eu rodei 3.720 quilômetros e fiquei 56 horas dentro do ônibus. Agosto não vai ser diferente. E acho que setembro também não. Nesta toada, se não mudar a rotina, até dezembro terei rodado 22.320 quilômetros em 336 horas.

Quando terminei de fazer esta conta eu achei que tinha errado alguma coisa. Aí pedi para um caboclo mais entendido do riscado assuntar se eu tinha feito o cálculo certo. Tinha. E quando ele entendeu a conta ficou me olhando de rabicho de olho um tempo, resolvendo se perguntava ou não. Aí perguntou: “vale mesmo a pena rodar 930 quilômetros todo final de semana?”.

Antes de continuar este causo, me deixa explicar: nos últimos meses eu tenho me dividido em duas casas: a “casa que eu preciso” e a “casa onde mora meu coração”. De segunda a sexta eu fico na casa que eu preciso. Mas no final de semana, mal termina a sexta-feira, eu corro para a “casa do coração”.

Aí na semana passada, enquanto eu fuçava na internet para ver se o tempo passava mais ligeiro, recebi um e-mail de um caboclo lá de Minas: o Chico. Garrei numa prosa boa com esse mineiro e aí, conversa vai, conversa vem, o Chico mandou essa: “a fibra ótica é boa mas perde muito ainda para o velho calor humano”. A prosa era sobre amizade, carinho, saudade e todas estas coisas que a gente só entende “mesmo” quando fica longe. E foi pensando no que o Chico falou que eu respondi a pergunta do meu amigo entendido em números: “vale... vale muito à pena”.

E aí, prá terminar a prosa, botei prá tocar uma moda do Alvarenga e Ranchinho:

“Ó que saudade que eu tenho
Que doce recordação
Da minha casa de páia
Que eu deixei lá no sertão
(...)
A casa menor da terra

Para algumas coisas na vida não adianta fazer conta, nem medir a distância, contar o tempo... A gente ama e ponto.