08 novembro 2006

Respeitável público


Quanta alegria. Foi armado o circo!
Está em festa o largo da matriz
Em volta dele corre a meninada
E eu brincando junto também sou feliz

Acho que todo mundo já pensou em fugir com o circo um dia. Todo mundo. Mesmo que por alguns segundos. Rapidinho, ali na arquibancada enquanto observava o trapezista. Tudo bem, tem quem não gosta de circo. Eu mesmo tenho uma amiga que tem “pânico” de palhaço... Mas que é um mundo incrível, ah isso é.

Eu amo circo! E quanto menor o circo, melhor o show. É sério! Esse negócio de circo famoso não tem graça... O legal é ver o cara que agora mesmo tava no trapézio, lá fora vendendo maça do amor. A moça que ajuda o palhaço, já, já aparecendo no número do equilibrista. E apresentador com sotaque espanhol (todo mundo tem sotaque no circo) é o mesmo que tira foto com o burrinho pintado de zebra do lado de fora... Isso sim é um espetáculo!

Só fui conhecer circo grande mesmo, do tipo “Beto Carreiro”, depois de adulta. É tudo lindo. Mas ainda prefiro a turma do “faz de tudo”.


Quando estava no ginásio ainda, de vez em quando entrava um ou dois alunos novos. Ficavam pouco tempo. No máximo três meses. Eram do circo. Tinham uma escola nova a cada parada. Aí um dia o circo foi embora - e uma menina ficou. Tinha fugido do circo. Acho que ela tinha uns 16 anos. Nunca esqueci o nome dela: Katiúcia (não era o nome artístico). Foi morar com um moço da escola. Casou, teve um filho. Nunca mais foi ao circo.

Eu ainda tenho vontade de fugir com o circo toda vez que vejo um. Mas claro, nunca tive coragem – e agora, com a correria de todo dia, menos ainda. Aí eu fico imaginando como ia ser. Só imaginando... E fico pensando na Katiúcia. E se ela só tivesse imaginado? Poderia ter dado tudo errado. Mas ela foi mesmo assim. Deve ser essa coisa do circo né? Esse pessoal não tem medo de nada – de buraco na estrada, de não ter público no show, do leão (quando tem um leão...), do trapézio, da falta de sorte... nada!

Já eu, que não cresci em circo, morro de medo de um monte de coisas... E morro de inveja da tal Katiúcia, que conheceu os dois lados da história e pode escolher com qual queria ficar. Já tem uns três anos que a vi pela última vez. Estava casada, três filhos e trabalhava meio período numa escolinha da cidade. Nunca se arrependeu. Ah! E agora ela vai ao circo – pra levar as crianças. Mas voltar para o picadeiro, nunca mais...

Em homenagem à Katiúcia, aí vai a letra de O menino e o circo, de Cascatinha e Inhana.

Minha cidade amanheceu risonha... Chegou o circo, está a anunciar
Grita o palhaço da perna de pau, minha gente acorda para ouvir cantar
E eu, menino, moleque de rua, vou bem na frente prá chamar atenção
Talvez me vendo assim animado, me dê entrada o dono da função

Oh! Raia o sol, suspende a lua
Olha o palhaço no meio da rua

Quanta alegria! Foi armado o circo e está em festa o largo da matriz
Em volta dele corre a meninada e eu brincando junto também sou feliz
"Zé Fogueteiro" hoje vai ao circo, todo exibido veio me contar
Prá queimar fogos já ganhou bilhete e no camarote diz que vai sentar

Oh! Raia o sol, suspende a lua
Olha o palhaço que está na rua

Para juntar dinheiro eu vou depressa vender cocadas que a doceira fez
Vou lavar vidros, vou vender garrafa ou engraxar sapatos prá qualquer freguês
E se de noite, prá meu desengano eu não puder sentar na arquibancada
Eu, de "gaiato" vou "forçando" entrada bem escondido por baixo do pano

Oh! Raia o sol, suspende a lua
Olha o palhaço no meio da rua...

2 comentários:

  1. Claro que eu também já quis fugir com o circo. Eu queria ser trapezista. Mas virei advogado - também ando na corda bamba de vez em quando mas não era bem isso que eu imaginava. E mesmo curioso não teria coragem de apostar prá conhecer o outro lado. Acho que medo é normal. O duro é ter que conviver com ele e a dúvida se de outro jeito a gente não seria mais feliz.

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  2. Nunca quis fugir com o circo. Aprendi a apreciá-lo depois de uma certa idade, embora tenha ido uma vez quando criança. Gosto cada vez mais, mas ainda fico nervoso com os trapezistas, acho que vão cair. Aliás, essa é uma referência engraçada: quando somos crianças, achamos que essas coisas não acontecem, jornalistas não levam tiro, trapezistas não caem, pilotos de corrida não morrem... hoje sei que não é bem assim. Uma homenagem pra você:

    Vai, vai vai começar a brincadeira
    Tem charanga tocando a noite inteira
    Vem, vem, vem ver um circo de verdade
    Tem, tem, tem brincadeira e qualidade

    Faço versos pro palhaço
    Que na vida já foi tudo
    Foi soldado, carpinteiro,
    Seresteiro e vagabundo
    Sem juiz e sem juízo
    Fez feliz a todo mundo
    Mas no fundo não sabia
    Que seu rosto coloria
    Todo o encanto do sorriso
    Que o seu povo não sorria.

    Vai, vai vai começar a brincadeira
    Tem charanga tocando a noite inteira
    Vem, vem, vem ver um circo de verdade
    Tem, tem, tem brincadeira e qualidade

    Fala o fole da sanfona
    Fala a flauta pequenina
    Que o melhor vai vir agora
    Que desponta a bailarina
    Que seu corpo é da senhora
    Que seu rosto é de menina
    Quem chorava já não chora
    Quem cantava desafina
    Porque a dança só termina
    Quando a noite for embora

    Vai, vai vai terminar a brincadeira
    Que a charanga já tocou a noite inteira
    Morre o circo renasce na lembrança
    Foi-se embora e eu ainda era criança

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