07 novembro 2007

Palmas


Sábado, sete e meia da manhã. Isso lá é hora de ligar para alguém? Acordei tropeçando no chinelo deixado ao lado da cama, tentando achar a porta e o telefone que tocava. "Alô?". "Flá? Escuta, o Paulinho batendo palma...". Foi assim, com as palmas do Paulinho, que meu dia começou.

Conheci o Paulinho há poucos meses. Dois ou três no máximo. A gente se deu bem logo de cara: gostamos de música, de chocolate e de desenhar. E passamos horas assim em silêncio, levados pela música e pelos traços coloridos que saem como mágica das pontas do lápis de cor. Temos quase a mesma idade - ele tem 27, eu 26. Mas vivemos em mundos completamente diferentes: eu vivo de correria, reclamando da falta de tempo, dos problemas que eu mesma crio, do que gostaria de ter feito, do que adoraria “não” ter feito... O Paulinho não reclama. E tem todo o tempo do mundo.

Cheguei a ler algumas coisas sobre autismo há algum tempo por curiosidade. Mas na prática (como tudo na vida), a teoria fica bem distante da realidade. Senti isso de perto quando conheci o Paulinho. Ele não chega a ser indiferente, mas não entende muito bem o que acontece a sua volta. Na maior parte do tempo se comporta como se as outras pessoas não existissem. Às vezes rejeita o contato físico e nos olha como se não estivéssemos ali. Não reage a alguém que fale com ele ou o chame pelo nome. E o mais difícil (talvez o mais doloroso para quem está o tempo todo com ele), é sua dificuldade em mostrar suas emoções - exceto se estiver muito bravo.

Uma vez por semana eu paro tudo para desenhar com o Paulinho. Descobri que ele gosta de Renato Teixeira (como eu disse, a gente se parece...) e por duas vezes, enquanto escutávamos música e desenhávamos, tenho certeza – ele sorriu para mim. Foram dois momentos únicos. Porque ali, no mundo do Paulinho, nossas vitórias são outras. Um sorriso é suficiente para ganhar o dia, a semana, o mês inteirinho. São frações de segundo que me garantem: ele sabe que estou ali.

Há alguns dias assisti ao filme do argentino radicado no Brasil, Hector Babenco: O Passado. Um dos personagens da história (que também não sabe lidar lá muito bem com seus sentimentos) dispara ao longo do filme: “fala agora, antes que seja tarde”. O Paulinho vai embora para outra cidade nos próximos dias. No último sábado, enquanto a mãe dele organizava algumas coisas para a mudança ele encontrou no meio da bagunça um álbum de fotos. Quando viu uma foto nossa juntos, começou a bater palmas. Poderiam ser só palmas. Para mim? Foi uma declaração de amor de um amigo que soube como poucos mostrar todo o seu carinho...

Vai saber quanta gente está esperando você “bater palmas”.
Ou só falar. Falar agora, antes que seja tarde...


“Os verdadeiros amigos do peito, de fé, os melhores amigos (...)
Sabem entender o silêncio e manter a presença mesmo quando ausentes
Por isso mesmo apesar de tão raros, não há nada melhor do que um grande amigo”

Renato Teixeira

3 comentários:

  1. Esse post me deixou arrepiado e com um nó na garganta. Acho que isso diz tudo.

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  2. Fla...

    Eu e o Marquinhos estamos "babando" no seu blog!!!
    PARABENS!!!

    Ah, tenho certeza que esse recadinho sobre amigos é pra gente!!!
    bjos

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  3. vale mesmo a pena passar aqui de vez em quando pra ver o que você tem aprontado...
    vi fotos suas no Orkut. você está com uma cara ótima! (=

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